A iniciativa foi do professor de História, Moacir da Costa, com apoio e participação do SINPRO, SINDIFOZ E SINTE, sindicatos ligados à educação em Itajaí e região. Com participação de Rodrigo Sartoti, Messias Consoni e Marlene de Fáveri.
DEBATE SOBRE O MOVIMENTO “ESCOLA SEM PARTIDO”
30 DE AGOSTO DE 2017
Na quarta-feira, dia 30 de agosto, no auditório da Escola de Educação Básica Deputado Nilton Kucker, em Itajaí-SC, aconteceu o debate sobre o movimento ESCOLA SEM PARTIDO, com participação de Rodrigo Sartoti, advogado doutorando em Direito; Messias Consoni, professor; e Marlene de Fáveri, historiadora e professora da pós-graduação em História na UDESC. A iniciativa foi do professor de História, Moacir da Costa, com apoio e participação do SINPRO, SINDIFOZ E SINTE, sindicatos ligados à educação em Itajaí e região, além de movimentos sociais. Compareceram professores de cidades vizinhas, além da capital, representantes de sindicatos ligados à educação, alunos/as de outras escolas e da própria escola que sediou o evento, além de outras pessoas da comunidade interessadas no debate sobre o tema polêmico e que vem interferindo no processo educacional e cultural brasileiro.
O professor Moacir abriu o evento agradecendo e apresentando os componentes da mesa, com destaque à professora Marlene de Fáveri, protagonista de um caso que tomou repercussão nacional a respeito das atuações do movimento-tema do debate. Em relato emocionado, mas que ilustrou a importância da educação dos sujeitos para a transformação social, o professor Moacir desculpou-se por ter de retirar-se, já que falecera, no mesmo dia, a sua irmã, pessoa que o ajudou a estudar e a seguir a vida acadêmica com muito sacrifício, em um contexto difícil em uma violenta periferia da cidade.
Na abertura do debate, já com mesa composta, o advogado Rodrigo esclareceu a origem do movimento Escola Sem Partido, como proveniente de uma denúncia de doutrinação e como reedição de um movimento semelhante dos anos de 1970, nos Estados Unidos, quando alunos filmavam ou gravavam áudios de aulas, em um movimento persecutório aos professores.
No campo jurídico, o advogado esclareceu sobre a inconstitucionalidade de projetos de Lei promovidos por esse movimento, a exemplo de um processo no estado de Alagoas onde a Lei que censurava e criminalizava os professores chegou a vigorar e foi suspensa. O caso recebeu a atenção do sindicato dos professores que entrou com vários processos, até tornar-se uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) ajuizada pela Confederação dos Trabalhadores em Estabelecimentos de Educação (CONTEE), em maio de 2016, para o Superior Tribunal Federal (STF), ao que o ministro Roberto Barroso concedeu liminar concedendo suspensão integral da Lei 7.800/2016 daquele estado. Foi um passo essencial para barrar propostas similares.
Nas discussões, houve denúncias como a perseguição à atuação de uma professora de Educação Infantil por fazer uma releitura de conto que foi interpretada como estímulo à “ideologia de gênero”, ou como a tramitação de Projetos de Lei, ou já em vigor, nas esferas municipal, estadual e nacional, amparados por movimentos conservadores, contrariando a Constituição Federal que garante a liberdade de expressão em diversos trechos de sua redação.
Algumas cidades, como Balneário Camboriú e Brusque, têm denúncias de Projetos de Lei semelhantes, instaurando censura nas salas de aula. Na Assembleia Legislativa de Santa Catarina, também estaria tramitando um projeto de Lei da mesma natureza – importante observar a origem dos partidos políticos interessados e a serviço de tal movimento. De qualquer forma, apesar da total inconstitucionalidade e inviabilidade dessas iniciativas sob o ponto de vista jurídico, alerta-se para o movimento reacionário, conservador e persecutório que pode se intensificar a partir do movimento Escola Sem Partido, como no recente e polêmico caso da professora Márcia Friggi, catarinense, agredida por um aluno. Em seguida, nas redes sociais, a professora foi vítima de intolerância política nos comentários do Facebook ao apontarem que ela mereceria tal agressão devido aos seus posicionamentos políticos expressados em outros momentos.
Segundo o professor Messias, o texto do movimento Escola Sem Partido elenca 6 (seis) deveres dos professores que inviabilizam o exercício do livre pensar, a análise social e histórica de forma crítica etc. No texto, citam casos do que chamam de doutrinação para justificar os projetos de Lei, sendo o número de casos irrisório no dia-a-dia, em um universo nacional. Reduzem a educação à transmissão de assuntos técnicos, limitando a própria dinâmica do processo de aprendizagem e de pesquisa. Tratam o educando como um ser sem história, passivo e incapaz de analisar contextos, como se não estivesse conectado ao mundo em outras fontes de conhecimento. Estimulam a intolerância às diferenças e ao debate, e colocam a escola e a família como instâncias antagônicas, creditada absurdamente somente à família a responsabilidade sobre a educação ideológica dos educandos.
Debatedores e o público denunciaram problemas estruturais nas escolas públicas que dificultam o funcionamento e mereceriam mais atenção. As escolas sofrem um processo de sucateamento que acaba sendo o argumento neoliberal para privatizações como solução. Os movimentos deveriam ser intensificados para garantir o direito à educação pública, democrática e de qualidade, ao invés desse movimento conservador.
A professora Marlene de Fáveri, em sua fala, associou suas pesquisas a respeito de gênero com outras formas de injustiças sociais, desigualdades e retiradas de direitos, contra as quais ela vem lutando no exercício de sua profissão. Historicamente, em todas as culturas, em todos os tempos, o controle sobre o corpo é o controle sobre as mentes. O processo que a professora sofreu, impetrado por uma orientanda que a acusou de perseguição ideológica, apoiada pelo movimento Escola Sem Partido em repercussão nacional, teve esse fundo ideológico, difícil de contrapor quando reforçado por dogmas religiosos.
Algumas intervenções de alunos e de professores traduziram a preocupação com a educação legítima e democrática. Contudo, também houve espaço para manifestações em contradição: sobre o recente golpe no país. Houve a defesa de que o impeachment foi legal, e a defesa de que foi golpe. Sobre as ocupações em escolas, houve um questionamento sobre o direito de quem não quer protestar e a constatação de que nenhuma transformação se dá com passividade. Houve a crítica sobre as composições políticas eleitoreiras de esquerda com direita e as ponderações sobre viabilidade de projetos de governo. Enfim, uma clara demonstração da riqueza na possibilidade do debate democrático, algo que não poderia acontecer com as tais Leis da Mordaça. O próprio nome do movimento também foi questionado, já que representa apenas uma ideologia, contra a pluralidade prevista constitucionalmente.
Ainda foram debatidos temas como: a laicidade do estado e os interesses de líderes religiosos que incharam esse movimento, acirrando a intolerância sobre gêneros, raças, expressões políticas etc.; a interferência midiática no pensamento de grande parte da população; a perseguição de professores em recorrentes denúncias; a violência contra a mulher – desde os ataques à Presidenta Dilma e o feminismo, entre outras pontuações.
Outro momento relevante a registrar foi a interferência emocionada de uma professora aposentada que provocou, nos representantes sindicalistas, estudantes, professores, ações concretas a partir do evento – que não ficasse apenas nas discussões, mas que se indicassem ações conjuntas como defesa do estado democrático e dos direitos sociais.
Em sua fala, o representante do Sinpro, diretor Thiago Castro Moreti, enfatizou que, se há doutrinação da população, ela acontece por meio da mídia, da ideologia da direita muito bem organizada. Ele apontou que movimentos como o Escola Sem Partido e suas Leis da Mordaça provocam aos movimentos sociais a intensificação de suas ações e seu fortalecimento para a restauração da democracia no país. Ao que a professora Marlene reforçou, revelando que, segundo seus estudos sobre a II Guerra Mundial em Santa Catarina, é fundamental a produção do medo, a pressão psicológica, para o controle social, pois produz um imaginário que torna as pessoas passivas. Imaginário este, hoje, intensificado pela mídia.
No encerramento do evento, os representantes sindicais e de movimentos sociais, movimento negro, movimento feminista, professores da cidade e da região, propuseram encontros e ações conjuntas para a mobilização de suas bases.
Professora Eliss de Castro